Chico sobre João Gilberto
Quando apareceu Chega de Saudade, foi um choque tremendo, me lembro perfeitamente. Ficava horas, a tarde inteira ouvindo aquilo, ouvindo, ouvindo, ouvindo... Conhecia o violão de João Gilberto desde o disco da Elizeth Cardoso, Canção do amor demais, um disco que freqüentou muito a Telefunken dos meus pais. João tocou violão em duas faixas, “Outra vez” e “Chega de saudade”. Mas a gravação de João Gilberto era diferente. Eu nem sabia que “Chega de saudade” era do Tom Jobim, tanto que, ao pedir dinheiro aos meus pais para comprar o disco, disse que a música era do Vinicius de Moraes, o autor da letra e amigo do meu pai. Ouvia Chega de Saudade sem parar. Eu e um amigo meu de rua ficávamos ali, com violão, tentando decifrar a batida e as harmonias de João. Quando saiu o primeiro long-play do João Gilberto, a gente repetia “Aos pés da cruz” não sei quantas vezes na tentativa de fazer aquela introdução. Por morar em São Paulo, eu levava uma desvantagem em relação ao pessoal do Rio. Não havia televisão na minha casa. De vez em quando, chegava um amigo, dizendo: "Vi aquele cara esquisito que você gosta na televisão." João Gilberto apareceu como uma coisa misteriosa. Ele era diferente de tudo até para um jovem de 18 anos. Eu tinha 14 anos e, na época, ter quatro anos a menos significava uma diferença brutal.
*Chico em entrevista a Almir Chediak, 1999
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